segunda-feira, 30 de maio de 2016

Hino a Áton


O Universo vem ao mundo sobre a tua mão,
Como tu o crias.
Ergues-te,
Ele vive.
Deitas-te,
Ele morre.
Tu és a extensão durável da vida,
Vivemos de ti.
Os olhos fixam continuamente a tua perfeição,
Até ao teu deitar,
Deitas-te a ocidente,
Todo o trabalho cessa.
Ao teu acordar,
Fazes crescer todas as coisas para o faraó;
O movimento apodera-se de cada perna,
Pões em ordem o Universo,
Fá-lo surgir para o teu filho,
Proveniente do teu Ser,
O rei do Alto e do Baixo Egipto,
Que vive da harmonia universal,
O senhor do duplo país,
Filho de Rá,
Que vive da harmonia universal,
Senhor das coroas,
Akhenaton,
Que a duração da sua vida seja grande!
Que a sua grande esposa, que ele ama,
A senhora do duplo país,
Nefertiti,
Viva e rejuvenesça,
Para sempre, eternamente!

Ave!
Partilho a última estrofe de um poema escrito pelo faraó Akhenaton para adorar Áton, o Sol, segundo a tradução de Isabel Jardim em “Breve História da Civilização”, de Will Durant.
Akhenaton é um dos faraós mais conhecidos das mais de 30 dinastias faraónicas que o Egipto teve. Ironicamente, o seu nome foi condenado ao esquecimento, pela tremenda revolução religiosa que impôs no Egipto, ao renegar os inúmeros deuses da tradição, e implementar a adoração do deus único, Áton, o Sol. Muitos historiadores consideram-no o primeiro monoteísta da Humanidade.
Embora breve (morreu com pouco mais de trinta anos), deve ter tido uma vida fascinante, como relatou na profunda paixão e amor que demonstrou pela sua rainha, Nefertiti, que no nosso Tempo é mais conhecida inclusive do que o próprio faraó.
Erradamente, há muitas páginas na Net que afirmam que este é o poema mais antigo do mundo. Esse título pertencerá (até prova em contrário) a outros dois poemas. “A Epopeia de Gilgamesh”, escrito na Suméria por volta do ano 2000 a.C., ou ao “Conto do Náufrago”, escrito no Egipto algures no século XXI a.C.
Akhenaton foi faraó até ao ano 1334 (ou 1336) a.C., o que significa que o seu poema-hino tem mais de 30 séculos. Era mais antigo para Júlio César do que a fundação do Reino de Portugal é para nós. A História é assim mesmo, tem este poder fascinante de nos esmagar. Isto é Imperium.



Addendum

terça-feira, 24 de maio de 2016

Obras em Reserva – O Museu que não se vê, Lisboa

Ave!
Para apaziguar a fúria dos Portugueses durante a ausência de "As Tentações de Santo Antão", de Hieronymus Bosch, o Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA) inaugurou a exposição "Obras em Reserva - O Museu que não se vê", composta por parte do espólio do MNAA que não costuma estar em exibição.
É suficiente para serenar a ira lusitana perante a ausência da mais importante obra de Arte que existe no país? Óbvio que não, mas sempre é mais uma razão para voltar ao mais importante museu nacional.

"As reservas de um museu são, por natureza, um território mítico: um lugar protegido, inacessível aos olhos profanos, onde se acumula e preserva um sem-número de obras de arte. Nelas ocultam-se peças isoladas ou formando séries, mais ou menos extensas e de diversa índole, acondicionadas por critérios vários, de natureza técnica ou mesmo pragmática. É esse espaço, velado e misterioso, que esta exposição pretende evocar, trazendo à luz e ao olhar curioso dos visitantes um vasto número de obras que, apenas pelos constrangimentos físicos do edifício em que se aloja o MNAA, não fazem parte da sua exposição permanente."
Não será apenas pelos constrangimentos físicos que a descrição oficial da exposição refere. Várias das obras expostas estão em fracas condições, e são de interesse reduzido relativamente ao majestoso espólio do museu, sendo algumas delas simples cópias, ou contando com atribuição discutível de autor. Não obstante, muitas das obras mais do que justificam a visita, para mais tratando-se de uma rara ocasião para lhes colocar a vista em cima.


A Grande Prostituta de Babilónia, Albrecht Dürer, Século XV (xilogravura)

A Família de Dário aos pés de Alexandre, Século XVIII (tapeçaria, lã e seda)

Nascimento da Virgem, atribuído a Perugino ou Rafael, Século XV (desenho em cartão)

 Anjo Custódio do Reino de Portugal, In Livro de Horas, dito de D. Manuel, Século XVI

Sem obedecer a qualquer critério em particular, são alguns exemplos da exposição que alberga igualmente uma tapeçaria onde se representa Hércules a capturar Cérbero, uma estátua de basalto de um leão proveniente do Egipto anterior a 30 a.C., várias estatuetas de santos em madeira policromada, pinturas diversas, desenhos e porcelanas.
É interessante perceber o quão pouco do espólio total do MNAA se encontra em exposição permanente, e uma oportunidade para observar aquelas obras que fazem parte do museu que não se vê.

Addendum

quinta-feira, 12 de maio de 2016

Galleria Sabauda, Turim III

Ave!
Quando Virgílio escreveu A Eneida, a história da queda de Tróia já tinha bem mais de um milénio. Ou seja, era mais antiga do que a história de D. Afonso Henriques é para nós, presentemente. Se tivermos em conta que Virgílio escreveu a sua obra há mais de dois milénios, ficamos com uma boa ideia do quão antiga é a história da Guerra de Tróia.
A mitologia Grega é uma das artes mais fabulosas da História Europeia. Alimentou incontáveis livros, poemas, músicas, filmes, esculturas, e, obviamente, pinturas.
Eneias é o herói cantada por Virgílio, que escapou durante a destruição de Tróia, para mais tarde vir a fundar a lendária Roma. Fez parte do mito de César e Augusto traçar a descendência da linhagem júlio-claudiana até ao mítico Eneias.
Ora, e onde é que se pode encontrar um dos quadros mais espectaculares sobre a fuga de Eneias de Tróia? Precisamente na Galleria Sabauda.

O quadro data de 1753, e foi pintado por Pompeo Batoni. Nele podemos ver Eneias a carregar o pai sobre os ombros, fazendo-se acompanhar pela esposa e pelo filho, enquanto à distância Tróia é consumida pelas chamas.


Quem também passou por Tróia foi outro herói mitológico, porventura o mais famoso de todos, Hércules. Inspirador de incontáveis epopeias, personagem de inúmeras aventuras, raras são as evocações da mitologia Grega que não referem o mítico filho de Zeus.
Entre os vários episódios herculanos que enriquecem as nossas bibliotecas, conta-se o encontro de Hércules e Dejanira com o centauro Nessus. A dada altura, depois de se casarem, Hércules e Dejanira chegam ao rio Evinos, onde encontram o centauro, que se oferece para ajudar a esbelta mulher a atravessar as águas turbulentas do rio. A meio do caminho, Nessus tenta violar Dejanira, levando Hércules a matá-lo com uma flecha envenenada (com o veneno da Hidra, que o herói matara num dos seus Doze Trabalhos).

Uma das representações mais conhecidas (fabulosa, para lá da compreensão humana) deste encontro é a estátua de Giambologna que se encontra em Florença, datada de 1599.

Na Galleria Sabauda não se encontra algo tão arrebatador, mas não deixa de ser merecedor de atenção reforçada o quadro do século XVIII onde Hércules confia Dejanira a Nessus.



Addendum

segunda-feira, 9 de maio de 2016

Galleria Sabauda, Turim II

Ave!
Com a morte de Lúcio Domício Enobarbo, mais conhecido por Nero, Roma viu-se a braços com uma guerra civil. Ao fim de apenas cinco imperadores, o império parecia destinado a desmoronar-se. Em apenas um ano, quatro homens foram proclamados imperadores. Foi graças a Vespasiano que o império se salvou. Na Galleria Sabauda há um busto seu, elaborado com a perfeição única dos mestres escultores italianos (neste caso, dos irmãos Collino, Século XVIII).


Reputado comandante militar, Vespasiano viria a ser uma figura de elevada importância para a História, ao fundar uma nova dinastia, a Flaviana. Sensato, respeitado pelos soldados, e com o apoio do seu filho Tito, que mais tarde ascenderia ele próprio a imperador, escreveu um dos episódios mais complexos do império romano: a tomada de Jerusalém, e a destruição do seu Segundo Templo.
Para além disso, o nome de Vespasiano está associado a uma das construções mais marcantes da História da Europa, o Anfiteatro Flávio, que em 2007 foi votado como uma das novas Sete Maravilhas do Mundo. Tal como Nero, o monumento é conhecido por outro nome: Coliseu de Roma. Curiosamente, o nome “colosseo” está ele próprio associado a Nero.
Voltando à Galleria Sabauda, para além do busto do Imperador Vespasiano, nela existe também um quadro do seu memorável anfiteatro, da autoria do holandês Gaspar Van Wittel. Datado de 1711, ilustra como se apresentava o Coliseu no século XVIII, bastante parecido com a estrutura imponente com que ainda hoje se mantém.



Addendum


quinta-feira, 5 de maio de 2016

Galleria Sabauda, Turim

Ave!
Itália é seguramente o único país do qual nunca me canso. Das quatro vezes que já lá fui regressei sempre deslumbrado com as suas magníficas cidades, todas elas "museus vivos". Turim não foi excepção, muito graças ao majestoso Polo Reale Torino, pólo museológico que engloba o Palazzo Reale, a Armeria Reale, a Biblioteca Reale, o Museo Archeologico, e a impressionante Galleria Sabauda, um assombro de três pisos que acolhe a impensável galeria de arte de uma das famílias mais importantes da História da Europa, os Sabóia.
Foi precisamente na Galleria Sabauda que deparei com um episódio extraordinário. Um professor, acompanhado dos seus alunos, debruçava-se sobre uma tela. A parte extraordinária do episódio é que a aula não estava a ser dada pelo professor, mas sim pelos alunos. O professor, enquanto tutor, apenas complementava, incentivava, "puxava" os seus discípulos para a vida da tela.
A tela em questão é um trabalho magistral (haverá algo em Itália que o não seja?) com a representação d'A Paixão de Cristo, pintada por Hans Memling em 1471. O quadro apresenta, num cenário único, os vários episódios da Via Sacra, levando os nossos olhos a navegar por cada conjunto de personagens que representa cada um dos episódios. É magnífico. De certa forma precursor do que mais tarde viria a ser a nona arte.
Note-se a facilidade com que se identificam a Última Ceia, o Beijo de Judas, o lavar de mãos de Pôncio Pilatos, a colocação da coroa de espinhos, a queda, a crucificação, ou a ressurreição. Verdadeiramente fascinante. É um daqueles quadros em que cada pormenor merece demorada atenção.

Tirei várias fotografias a pormenores do quadro, mas não vale a pena colocá-las aqui, uma vez que na era digital é mais fácil recorrer ao Google para encontrar uma imagem em alta resolução. Deixo apenas o pormenor de Pôncio Pilatos.


quarta-feira, 4 de maio de 2016

Imperium XXI

Ave!
Tal como o Imperator Caesar Divi Filius Augustus saúda os viajantes na Porta Palatina em Turim, assim dou as boas vindas a quem visita o Imperium XXI.
Aqui falar-se-á de História, Arte, Cultura, Literatura. Do melhor que a Humanidade tem para oferecer à nossa memória colectiva.
Isto é Imperium.